Com três hérnias de disco, cuiabana se torna a única faixa preta em kickboxing de Mato Grosso

Com três hérnias de disco, cuiabana se torna a única faixa preta em kickboxing de Mato Grosso

Quando Camila do Espírito Santo Maciel, 27, decidiu começar as aulas de kickboxing para ajudar sua irmã a superar o sobrepeso, nem imaginava que, quatro anos depois, se tornaria a primeira – e por enquanto única – mulher de Mato Grosso a conquistar a faixa preta da arte marcial. Para alcançá-la, o caminho foi árduo, com um ano inteiro de cinco treinos por dia, enfrentando três hérnias de disco e deixando para trás a sua profissão de formação, veterinária. Agora, ela pode dar aulas e pretende ir em busca dos próximos ‘dans’.


A primeira aula experimental que ela fez foi junto à sua irmã, mãe e pai. Os três continuam praticando kickboxing, mas ela mudou de academia depois que foi para um campeonato em São Paulo e lá conheceu seu atual namorado e sensei (professor), Renan Andrade. Algum tempo depois, decidiu deixar a veterinária e trabalhar junto com ele em seu Centro de Treinamento.

“Eu sou formada em veterinária e tenho especialização em cirurgia de pequenos animais. Mas comecei o kickboxing no início da minha especialização, e eu fui me apaixonando muito mais pelo universo do esporte”, lembra. Mesmo com muita gana e vontade de alcançar os níveis mais altos, ela se deparou com pessoas que duvidavam de sua capacidade, por ser mulher.

“Eu já ouvi várias vezes que eu não servia para isso, ia treinar e perguntavam o que eu estava fazendo lá, de pessoas sem paciência para ensinar. E eu já fui fazer alguns treinos em academias, que o pessoal olhava e falava, ah, essa menina não sabe nada e está aqui no treino com os meninos...”, lamenta.

Faixa preta

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Camila dedicou o ano inteiro aos treinos, com o objetivo claro de alcançar a faixa preta. Para isso, chegou a fazer cinco treinos por dia. “Eu fazia um treino [de kickboxing] de manhã, no final da manhã eu fazia - três vezes por semana - pilates, porque eu tenho três hérnias de disco, então sou obrigada a fazer. A tarde, todo dia, eu fazia musculação, e depois da musculação eu vinha, treinava só eu e o meu treinador. E a noite eu treinava com a turma toda também”, lembra. “Esse ano eu abdiquei de tudo só pra treinar para esse exame”.

Para alcançar uma faixa preta, o atleta deve passar por diferentes níveis. Todos começam ‘faixa branca’, e depois passam, em sequência, pelas faixas amarela, laranja, verde, azul, marrom e, por último, a preta.

Cada faixa tem seu ensinamento próprio e, também, um tempo de carência mínimo para conseguir passar para o próximo nível. Este tempo vai ficando maior quanto mais alto é o nível da faixa. Camila, por exemplo, ficou dois anos treinando com a marrom, até alcançar a preta.

Seu exame de faixa foi em São Paulo, na cidade de Piracicaba. “Tinham quase 40 atletas para graduar, tanto da marrom para a preta quanto dos outros graus da preta. E destes atletas, só tinha eu e outra mulher, o resto era tudo homem”, lembra.

Com essa dinâmica, Camila teve que lutar também com os homens presentes. A falta de mulheres é prejudicial, também, em campeonatos. “Geralmente em campeonato feminino a gente não faz diferenciação de faixa. No masculino, a luta é da faixa branca até a marrom, uma categoria, e tem a categoria dos faixa pretas, separado”, explica. “Mas como tem pouca mulher, não dá para fazer essa distinção, então quando o campeonato é feminino, é de branca até a faixa preta. Se eu participar, eu vou lutar com alguém que é menos graduado que eu, porque faixa preta só tem eu por enquanto”.

Para a atleta, vários fatores influenciam nessa ‘fuga’, principalmente o medo de se machucar - embora a arte marcial, segundo ela, pregue a não violência – e o estereótipo do corpo, já que muitas mulheres pensam que, se praticarem alguma luta, podem ficar muito ‘quadradas’.

No entanto, Camila manda um recado: “Não precisa ter medo das coisas. Quando eu comecei eu nunca imaginei que estaria aqui, nunca imaginei que eu seria capaz de ser a única mulher [faixa preta de Mato Grosso], minha ficha nem caiu direito. Eu acho que todo mundo tem que se dar uma chance e saber que é capaz, porque a gente, principalmente mulher, é capaz de muita coisa, muito mais do que a gente imagina. Acho que vale a pena dar uma chance, porque é um esporte que faz muito bem pra tudo, corpo, mente, [diminuir o] estresse do dia a dia, tratar melhor as pessoas, ter disciplina... Eu acho que vale a pena tentar”.

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